sábado, 22 de outubro de 2011

O negro na sociedade e a sua valorização

"O pior cego é aquele que não quer ver".



O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) tem dificuldade em quantificar as pessoas negras, mulatas e pardas da população brasileira. Há uma gama de denominações de tonalidades de pele digna de um mostruário de tintas, ou de uma paleta de pintor. Nos tempos antigos os escritores se referiam ao fruto da miscigenação com nomes como “morena cor-de-jambo”, e então aconteceram os nomes que vão do moreno claro, passando pelo médio, escuro, chocolate, até a cor de café. Para simplificar, os técnicos do IBGE criaram apenas três cores nessa variedade interminável de tonalidades: negro, mulato e pardo. No Brasil, mais da metade das pessoas é da cor de uma dessas denominações.


Instados a dizer, olhando para a sua pele, de que cor eles são, boa parcela dos mestiços negam a sua cor, e se espantam quando Camila Pitanga, morena, pelas denominações antigas, e filha de negro, se diz negra. Acham que ela está fazendo média. Afirmam que Camila é clara, e que os cabelos dela são lisos - outra obsessão brasileira, daí o sucesso retumbante da chapinha. Por que isso acontece? Os pardos não se sentem bem sendo e se denominando como tal? A palavra tornou-se pejorativa. Assim, as estatísticas não conseguem ser confiáveis.


Uma pessoa, que se dizia branca, e é exatamente da minha cor, espantou-se quando me viu pela primeira vez: “mas você não é parda!”. É que a internet faz acontecerem encontros de trás para frente, onde se salta diversas etapas. E ficam essas coisas assim, inexplicáveis.

E ainda há quem diga que no Brasil tudo é pacífico em termos de raça. Tem  muitas  portas fechadas para quem não está inserido em um suposta padrão de beleza europeu. Tais  Araújo, negra,  acusada  de interpretar uma personagem que não discute preconceito racial, mesmo assumindo os cabelos anelados, é vista com espanto, como se o negro tivesse a obrigação de sempre bater na tecla do racismo. As coisas não são bem assim!
 

Gente, não sejamos hipócritas! A polêmica sobre ter ou não ter o “Dia da Consciência Negra” é prova disso, é confirmação inconteste de que precisamos sim, desse dia e de muitos outros dias da consciência negra e de muitas outras consciências. Polemizar sobre ser feriado ou não é outra história. Ma,s diante dos fatos, é urgente, num mundo civilizado, disseminarmos a convicção da igualdade e da tolerância. As pessoas ainda não se acostumaram com o que diz a Constituição, e ainda acham um absurdo ser crime chamar o outro de “negão”, de “crioulo”. Desde quando é insulto se assumir negro? É natural insultar, e por isso protestam quando não podem fazê-lo, sem sentir os rigores da lei.
 

Para o “Dia da Consciência Negra”, quase todos ouvimos preconceitos raciais de todos os matizes, de quantos tons de pele temos por aqui: “Dia do negro? Mas não tem o dia do branco!” “Cotas para negros? Houve uma inversão. Agora os negros são melhores do que os outros? E as outras etnias ou minorias? Ninguém mais pode chamar negro de negro. Os eufemismos tampam o sol com peneira.
 

Esses protestos indicam que o dia é mais do que necessário. É preciso que os de cor “morena” aceitem os seus ancestrais negros e os reverenciem. Para haver esse respeito, sim. Este ocorrerá bem depois da conscientização para que a auto-estima brote e floresça. Não é ser melhor ou pior: é ser gente, é acreditar em si, em sua capacidade, não camuflar a sua cor ou omitir sua origem porque há preconceito dos outros.

Além disso, é preciso que combatemos brincadeiras “inocentes” ou apelidos, referentes à cor da pele, indicadas pela hora da noite, objetos ou situações, para dimensionar a quantidade de “negro” que existe naquela pessoa. Isso sim, é uma forma pejorativa (e ofensiva) de se dirigir a alguém. Devemos ver o ser humano, o caráter, e não simplesmente uma cor.

Mas, como valorizar o negro para as próximas gerações? Talvez, a existência de um herói nacional negro, alguém de coragem e com brilho, em que os negros possam se espelhar é uma necessidade. Então Zumbi dos Palmares está aí para a nossa admiração. Não foi alguém “inventado”. Não tem rosto e nem dados biográficos precisos, mas Tiradentes também não tem.
O nosso Alferes Joaquim José da Silva Xavier foi um criminoso que a Corte Portuguesa não só enforcou, mas também esquartejou, salgou e espalhou pelo país, levando a sua cabeça para Vila Rica - atual município de Ouro Preto, em Minas Gerais. Hoje todos o reverenciam, pela audácia de desafiar Portugal. Ensinando hoje, em alguns anos será natural para as crianças admirarem Zumbi dos Palmares. Sim, nós também precisamos de heróis, de referências.
 

Os negros estão na ordem do dia. Brilham nas suas capacidades individuais e, assim como tantos outros grupos, querem ser inseridos na sociedade com respeito. Por mais polêmica que seja, são essas atuais políticas públicas que buscam jogar luz na cor da pele e corrigir séculos de exclusão. Estas, até podem ser vistas por alguns como uma oficialização do preconceito, ou ainda, edificação de um muro para que no futuro se diga: “você chegou aqui por capacidade, ou porque a sua pele é negra?”. Sim, sei que essas argumentações estão circulando, mas a oportunidade igual para todos é a meta, e em seu rastro acontecerá a naturalidade em ser negro, mulato ou pardo, sem precisar esconder-se sobre um manto de fumaça chamada “moreno”. Seremos uma Nação, nada mais.

NARCISO, Mara. O negro na sociedade e a sua valorização. Café convidado. Disponível em: http://cafecomnoticias.blogspot.com/2010/03/cafe-convidado-o-negro-na-sociedade-e.html. Acesso em; 22/10/2011.

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